Pessoas, ONGs e grupos se unem para ajudar indivíduos em situação de pobreza menstrual no Brasil.
Participantes do clube Unidas Girl Up de Porto Alegre, em distribuição de kits de higiene
Menstruação, uma palavra que ainda pode causar constrangimento, mas uma situação com a qual mulheres e homens trans têm que lidar todos os meses. A menstruação dura em média de 35 há 45 anos, a partir da menarca, que é a primeira menstruação e marca o início dos ciclos menstruais mensais, até a menopausa que é o último ciclo menstrual. De acordo com o Censo Demográfico do IBGE de 2010, 30% do Brasil menstrua, ou seja, 60 milhões de pessoas. Porém, não são todas as pessoas que possuem condições de passarem por seus ciclos menstruais com acesso a absorventes e higiene para realizar os devidos cuidados. Segundo estudos da empresa de saneamento básico, BRK Ambiental, 1,5 milhão de brasileiras não possuem banheiros em suas residências. Esse tipo de situação se enquadra no que é chamado de Pobreza Menstrual, e precisa ser combatido.
Em 2014, o direito à higiene menstrual foi reconhecido mundialmente como questão de direitos humanos e saúde pública pela Organização das Nações Unidas (ONU). O grupo Girl Up, foi criado pela Fundação da ONU, tendo sedes em todo o mundo, e busca atingir o 5° Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que é a igualdade de gênero. Os clubes começaram a dar atenção para a situação da pobreza menstrual, realizando doações para ajudar aqueles que não têm condições de ter um ciclo menstrual com os produtos e a higiene necessária.
A sede do clube Unidas Girl Up em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, desde julho de 2021 tem realizado ações para distribuição de kits de higiene. Segundo Júlia Magalhães, presidente do clube, e Kimberly da Rosa, vice-presidente, em apenas 3 ações foram entregues, aproximadamente, quatrocentos pacotes de absorventes.
Não é apenas sobre a acessibilidade desses produtos, é referente aos sentimentos de medo, insegurança e desconforto que as meninas, mulheres e homens trans sofrem durante esse período, e o quanto algo que deveria ser comum a todos, se torna um item raro para pessoas em situação de vulnerabilidade social, como moradores de rua, pessoas de baixa renda e pessoas privadas de liberdade
Em Minas Gerais, a estudante de direito e empreendedora, Laura Moreira, desenvolveu um pesquisa que depois foi transformada em projeto de lei municipal, aprovado na câmara de vereadores da cidade Além do Paraíba. Ao saber que a Prefeitura da cidade estava distribuindo apenas um pacote de absorvente, Laura decidiu criar a ONG Florescer. Por um ano, a Florescer irá distribuir mil e setecentos absorventes nos bairros Matadouro, Goiabal e Terra do Santo.
Laura afirma que sua escolha de cursar Direito foi baseada em questão social, após ela conhecer meninas que não eram atendidas nas Unidades Básica de Saúde, ou sequer recebiam algum atendimento ginecológico. As famílias estavam com dificuldades de suprir a quantidade de absorventes necessária para essas garotas, algumas sofrendo de tiróideo e coágulo no cérebro.
Segundo a psicóloga, em formação psicanalista, Jéssica D’Avila, a pobreza menstrual causa problemas psicossociais para os indivíduos. Durante o ciclo menstrual, muitas meninas não comparecem às aulas por não terem absorventes, fazendo com que isso interfira no seu aprendizado, consequentemente, atrapalhando na hora da conclusão da escola, ingresso em uma faculdade ou obtenção de um emprego para que ela e as próximas gerações da sua família possam sair dessa situação de vulnerabilidade.
Dignidade vetada
A demanda por dignidade menstrual chegou até o Congresso Nacional. Em setembro de 2021, foi aprovado no Senado o Projeto de Lei 4968/2019 que previa a distribuição gratuita de absorventes higiênicos para estudantes dos ensinos fundamental e médio, mulheres em situação de vulnerabilidade e detidas. Os artigos que visavam à distribuição gratuita de absorventes foram vetados pelo presidente Jair Bolsonaro, no dia 7 de outubro de 2021. Os vetos presidenciais acabaram derrubados no Congresso.
Com isso, foi promulgada a lei 14.214, que Institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Além disso, prevê que as cestas básicas entregues no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) deverão conter como item essencial o absorvente higiênico feminino.
Assim, foi firmado um compromisso em combater a precariedade menstrual, como também a realização de campanhas informativas sobre a saúde menstrual e suas consequências para a saúde da mulher.
O prazo para a Lei entrar em vigor era de 120 dias. No entanto, mesmo com a Lei em vigor, até setembro de 2022 a distribuição dos absorventes não tinha começado. De acordo com o Senado Federal, a expectativa é que, por meio de Lei, sejam atendidas 5 milhões e 600 mil meninas e mulheres, de 12 a 51 anos, entre estudantes carentes da rede pública, moradoras de rua e presidiárias.
Matéria produzida por Karen Pereira para o projeto Marco Zero - Edição 71.
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