Especialista em saúde alerta que a falta de imunização coletiva pode fazer com que doenças já erradicadas voltem a circular no Brasil
As campanhas de vacinação não têm sido suficientes para manter a imunização da população brasileira.
Quando o médico inglês Edward Jenner, ainda em 1796, percebeu que era possível induzir o corpo humano a se proteger de uma doença inoculando uma versão leve e controlada do agente causador, iniciou um fundamental processo de saúde coletiva.
Hoje, mais de 200 anos depois da descoberta, o Brasil passou de referência na área a um país com baixos índices de imunização. Um dos exemplos é o sarampo, que antes erradicado voltou a apresentar surtos em várias regiões do país a partir de 2018.
A vacina tríplice-viral (que protege contra o sarampo, caxumba e rubéola) está no Programa Nacional de Imunização desde o ano 2000. Apesar de ser distribuída gratuitamente para crianças pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a taxa de imunização despencou na última década, o que pode explicar o aumento de casos.
De acordo com dados fornecidos pelo DataSUS, em 2010, 99% do público-alvo foi imunizado com a primeira dose da tríplice viral. Quase dez anos depois, a taxa caiu para 57%. E a situação piora com a segunda dose em que a taxa foi apenas de 48%.
“Têm vários fatores que podem explicar a queda na imunização”, afirma a enfermeira Debora Diniz, que é coordenadora da Central de Imunização em Itatiba, no Estado de São Paulo. “Como a cobertura era boa, as doenças ‘desapareceram’ e os pais entendem que não precisa mais vacinar. Vale destacar que antigamente se tinha menos vacinas do que se tem hoje. Então, se a criança tem alguma reação da que foi aplicada aos dois meses, os pais não trazem mais para as outras. Dá para falar ainda de algumas linhas de homeopatia, que pregam a não vacinação”, explica.
De acordo com o Ministério da Saúde, os últimos casos de sarampo no país foram registrados em 2015. No ano seguinte, a Organização Mundial da Saúde emitiu um certificado atestando que o Brasil havia eliminado a circulação do vírus.
Nesse período, a média de imunização nacional girava em torno de 96% do público-alvo, taxa que caiu para 91% em 2018. Naquele ano foram mais de 10 mil casos, principalmente na região Norte do país, que vivia forte migração de venezuelanos, também com baixo grau de imunização.
Em 2019 a situação piorou bastante, com a taxa de imunização em 57%, a menor da década. Como efeito colateral, o número de casos subiu para 18,3 mil. Na mesma direção, os casos de caxumba, só nos primeiros 7 meses de 2019, subiram 130% no Estado do Rio de Janeiro, segundo a Secretaria Estadual de Saúde.
As vacinas em gotas facilitam a imunização de bebês e crianças que tem medo de injeção.
Outras doenças
Especialistas no setor temem que o mesmo possa acontecer com outras doenças, em especial com a Poliomielite, erradicada no Brasil há 30 anos. A imunização, que no começo da década atingia quase 100% da população, já reduziu para 51% no ano de 2019.
“É uma doença eliminada que pode voltar sim e isso preocupa. Por isso são realizadas campanhas nacionais e estaduais. Atualmente está ocorrendo a do sarampo para adultos e crianças, e em breve começaremos a da poliomielite. É fundamental que os pais participem. Se não há tempo durante a semana, utilizem o Dia D, geralmente em um sábado, para vacinar seus filhos”, conclui.
A vacina da Febre Amarela é obrigatória para viajar para países tropicais ou com surtos da doença. Em 2017, no entanto, mesmo quem não tinha planos de visitar outra localidade acabou procurando pela vacina, porque o Brasil viveu um surto da doença. Naquele ano, 261 pessoas morreram, além dos 1.412 casos registrados em macacos.
Itatiba registrou uma morte no período. “A cidade precisou pensar em outras formas de vacinar. Lembro que a Secretaria de Saúde criou equipes volantes que foram para as feiras livres e para os supermercados”, recorda o Secretário de Saúde, Dr. Fabio Nani. “O que chamou mais atenção foi a vacinação no cemitério, porque aproveitamos o fluxo de pessoas no dia 1º de novembro, Finados e funcionou”, lembra o médico.
Para Nani, a situação vivida em 2017 pode ser um exemplo de como melhorar os índices de vacinação. “De fato, a Febre Amarela mostrou como a vacinação é importante e mostrou que o poder público deve criar alternativas para estimular a vacinação”, completa.
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