Se você possui redes sociais, provavelmente já deve ter visto os termos “cancelado, cancelamento ou cancelar” circulando entre os assuntos mais comentados. Mas ao que se refere essas variações que no fim significam a mesma coisa? Trata-se de uma prática virtual que tem sido chamada de "cultura do cancelamento”, onde pessoas que podem ser famosas ou não, são canceladas ao terem atitudes e comportamentos considerados politicamente incorretos. Mesmo que a oficialização do termo tenha acontecido lá por meados do ano de 2017, essa prática já acontecia há muito tempo, mas, com a internet, ganhou novas proporções.
E para se ter uma noção das proporções que essa onda tomou, em 2019, o cancelamento foi eleito como o termo que mais marcou o ano. Segundo o dicionário australiano Macquarie - que anualmente elege a palavra/termo que demonstra um importante comportamento humano. Um ano depois e novamente o termo tem estado entre os tópicos mais citados nas redes sociais. Um dos motivos para isso é a nova edição do Big Brother Brasil, onde algumas das atitudes e falas dos participantes têm trazido de volta o debate sobre a cultura do cancelamento. O medo de ser cancelado na internet é tão real que inclusive foi pauta de uma das primeiras interações realizadas entre os participantes de um dos reality shows mais populares do Brasil.
Mas e quais seriam as consequências para quem é cancelado? Um estudo realizado no ano passado pela empresa Mutato, catalogou os três tipos mais comuns de “cancelamentos”. São eles o “boicote”, mais relacionado à política e marcas. O “ban e close errado”, que atinge pessoas anônimas e são casos mais isolados. E o que possui consequências mais graves, o “linchamento virtual e cancelamento”, gerado por comportamentos considerados incorretos. Em outras palavras, a cultura do cancelamento nem sempre surte o efeito que muitos desejam ou esperam. Tanto em casos de celebridades como de pessoas comuns, pode ser considerado como dano maior e mais grave o psicológico do que o financeiro. Diante disso, quais são as consequências dessa cultura?
Segundo o sociólogo Dominique Wolton, em entrevista concedida ao G1, “existe uma diferença entre comunidade e sociedade. A comunidade reúne todos aqueles que têm pontos em comum. Uma sociedade reúne os que têm pontos em comum, mas também todos aqueles que não têm. As redes sociais fazem comunidades: pessoas que querem ouvir apenas aquilo que gostam. São as solitudes interativas. Porém, o futuro da humanidade é uma sociedade. Não é uma comunidade”.
Se associarmos o pensamento de Wolton com a cultura do cancelamento, teremos uma noção de como é uma cultura falha. O que acontece é que quando uma pessoa começa a atacar aquele que cometeu um erro, as outras entram junto e vira uma manada conformista que só se ouve o que se quer. Nesse cenário de comunidades, uma opinião contrária a da maioria tem mais dificuldades para ser entendida e não há espaço para a “evolução humana” ou para o “se aprender com o erro”.
Além de receber o rótulo de “cancelado”, a pessoa que erra acaba ficando para sempre marcada pelo seu pior momento e as pessoas não dão chance para que ela repare o erro. Como aponta o colunista do The New York Times, Ross Douthat, em uma coluna sobre cancelamento. "Você pode ser cancelado por algo que você disse em meio a uma multidão de completos estranhos se um deles tiver feito um vídeo, ou por uma piada que soou mal nas mídias sociais ou por algo que você disse ou fez há muito tempo atrás e sobre o qual há algum registro na internet. E você não precisa ser proeminente, famoso ou político para ser publicamente envergonhado e permanentemente marcado: tudo o que você precisa fazer é ter um dia particularmente ruim e as consequências podem durar enquanto o Google existir".
Finalizo esse artigo, lembrando aquela velha frase que todo mundo já conhece de que “o ser humano é falho”. Devemos acabar com a cultura do cancelamento, pois devemos cancelar atitudes e não pessoas. Errar é humano e é com os erros que as pessoas aprendem e evoluem. Se o fato de que todos erram não te convencer, lembre-se que na cultura do cancelamento o próximo a ser “cancelado” pode ser você.
Créditos da foto: Pixabay
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