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Nicole Bek

Criador do Plural fala sobre modelo de negócio no jornalismo independente

Fundador do principal veículo alternativo e independente de Curitiba, o jornal Plural, Rogério Galindo é um dos nomes mais conhecidos do jornalismo político paranaense. Ao longo de quase duas décadas atuou como repórter na Gazeta do Povo. Na política, consolidou seu nome na profissão sobretudo nos últimos anos, como editor da coluna e do blog Caixa Zero, vinculado ao portal da instituição. Em 2018, após 18 anos no veículo, saiu do jornal.

Foi então que decidiu dar forma ao projeto que sua esposa e jornalista Rosiane Correia de Freitas já tinha: fazer um jornal. Em parceria com o cartunista Alberto Benett e Rosiane, Galindo deu inicio ao Plural, um portal de jornalismo independente, que busca nos seus leitores o apoio para sua existência. Em entrevista ao portal Mediação, ele contou as dificuldades de se aventurar em um projeto autoral e sem apoio financeiro. "Quem é vivo sempre aparece", é o que aponta o dito. E aqui está o Galindo novamente no "Fala, Jornalista!", série de entrevistas com grandes nomes do jornalismo para falar daquilo que amam: o jornalismo.

Como surgiu a ideia de empreender em um jornalismo independente?

Não foi só uma ideia, foi uma necessidade também. Eu sai da Gazeta do Povo em um momento em que a gente estava com três crianças, minha esposa estava dando aula na Universidade Positivo, e a gente ficou pensando no que fazer da vida. Ela sempre teve um projeto de fazer um jornal. A gente não tinha condições financeiras, mas achamos alguns parceiros iniciais para tocar a ideia, mesmo não sendo a situação ideal, mas resolvemos que era o caso de tentar e contar com o apoio dos próprios leitores.

"Não foi só uma ideia,

foi uma necessidade também"

Qual foi o modelo de negócio que usou para criar o plural?

O modelo de negócio é assinaturas e apoios. O acesso é totalmente livre. As pessoas não precisam pagar. Mas a gente pede contribuições para que o jornal possa continuar existindo. As pessoas colaboram mais pela própria existência do jornal, e não porque sem isso não poderiam ler. A gente tem anúncios e outros métodos de financiamento, AdSense, mas 90% da nossa receita própria é de assinantes.

Como o jornalismo independente se financia?

De várias maneiras. Muitos portais tem uma espécie de padrinho. Tem também a forma de fazer a pessoa ter que pagar para assinar. Nós decidimos não ser dependente da publicidade, porque você acaba não fazendo o que você quer, e sendo uma espécie de escravo do público. Depender de anúncio faz com que você dependa do poder público. É difícil, porque não tem tanta gente com dinheiro sobrando para fazer assinatura e apoios. É um trabalho de convencimento para que as pessoas vejam valor no seu trabalho.

Por que o jornalismo independente?

Não é uma escolha. A gente tinha que fazer assim. Não somos herdeiros da afiliada da Globo, não temos ninguém milionário, tínhamos que sobreviver. Lógico, tentamos nos manter independente do poder econômico e politico para fazer um jornalismo decente que a gente quer.

"É um trabalho de convencimento,

para que as pessoas

vejam valor no seu trabalho."

Antes e depois do jornalismo: como a profissão te transformou?

Jornalismo é relatar o mundo, eu sempre acho isso, então para relatar o mundo você precisa conhecer ele melhor. À medida que você vai conhecendo o mundo melhor você vai mudando em alguns sentidos. À medida que você conhece melhor a política, você pode ficar mais sínico, à medida que você conhece melhor a cidade, você pode ficar mais solidário. Mas certamente hoje eu sou mais bem informado, e tenho uma empatia maior com as situações e com as pessoas que vivem em realidades difíceis.

O jornalismo fortalece a democracia?

Não existe democracia sem jornalismo, se as pessoas não puderem fiscalizar o governo e não tiverem como saber o que está acontecendo. Se você não tiver o mínimo de transparência sobre a tua sociedade, não existe democracia. Então não é que o jornalismo fortalece a democracia, o jornalismo é uma das bases necessárias para a democracia existir, e quanto mais forte ele for, mais forte será a democracia.

Como o jornalismo pode sobreviver?

Eu sou dos que acreditam que o jornalismo vai acabar. Mas temos que nos preocupar com o financiamento dessa atividade, que hoje está bem difícil com o advindo da internet que tornou tudo mais complicado, porque a publicidade que era o grande meio de financiamento está hoje monopolizada pelo Google e Facebook e outros player, então temos que achar outros caminhas como o dos assinantes.

"O trabalho do jornalista sempre foi esse

de combater versões erradas,

equivocadas e enganosas"

Por que as fakes news se transformaram comuns em meio ao jornalismo? Como o jornalismo pode fazer para combater a desinformação?

Eu tenho a impressão de que essa se tornou a questão mais presente do jornalismo, não por ela ser de fato a mais importante, mas por ela ter ganhado uma certa visibilidade. Eu acho importante nos preocuparmos com isso, mas mentira sempre existiu, governo sempre mentiu, pessoas poderosas sempre tentaram fazer valer suas versões usando meios não éticos para isso, sempre tivemos esse tipo de problema. O que aconteceu foi que a internet potencializou isso e temos que nos preocupar. Mas o trabalho do jornalista sempre foi esse, de combater versões erradas, equivocadas e enganosas. No fundo não mudou. O que mudou foi as ferramentas e métodos. Mas temos essa função desde sempre.

O melhor da profissão:

Uma pergunta difícil. Acho que só faz sentido ser jornalista se você gosta de fazer isso. E para gostar da profissão tem que gostar de conhecer o mundo e de pessoas. Não existe jornalista bom que não sente empatia pelas pessoas, está na profissão errada.

O pior da profissão:

A sensação de impotência. Você vê tanta coisas que precisava mudar, que as pessoas precisavam saber, se conscientizar, que você precisava fazer, e você é tão pequeno para fazer tudo isso, para dar conta, e as coisas não mudam tão rápido. A gente em que fazer trabalho de formiguinha, e as vezes é cansativo, lento e desanimador. Mas o desalento passa quando você consegue faze alguma coisa boa e então segue em frente.

O melhor amigo do jornalista é?

A empatia.

"Não existe jornalista bom que

não sente empatia pelas pessoas"

Como é ser jornalista em um momento em que a imprensa brasileira sofre tantos ataques?

A "imprensa bem feia" sempre sofre ataques. Então isso não é uma coisa nova. Em certos sentidos a gente está até mais protegidos hoje do que em outros momentos. Mais protegidos no Brasil do que em outros lugares. Mas tem profissões bem mais perigosas, então somos mais um exposto. Mas lógico, temos que lutar para que esse tipo de bizarrice pare, é preocupante, mas é uma coisa permanente.

Quais as maiores dificuldades de se trabalhar com jornalismo no cenário atual?

A crise de credibilidade. Temos uma situação em que as pessoas produzem muita informação, existe muita coisa falsa, bizarra. É difícil você educar muitos leitores, que faz a diferença a informação produzida por um jornalista que apura e checa. Muita gente acaba se informando pelo WhatsApp da família, pelo Facebook, e isso piora muito a qualidade do debate e da democracia em ultima instancia.

Um recado para os futuros jornalistas:

Leiam. Acho que quanto mais a gente lê, mais a gente vive, mais a gente conhece o mundo. Ler livros, assistir filmes bons é fundamental. Quem não gosta de ler não vai ser bom jornalista nunca, vai ficar preso em um pequeno círculo, dando voltinhas.

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