Gabriela Brandalise é jornalista, formada há 16 anos pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). Brandalise já trabalhou como repórter e âncora das rádios CBN Curitiba e Educativa, e também na Rádio Clube. Atualmente a jornalista trabalha como assessora de imprensa para uma federação de empresários do Paraná.
Com dois romances já publicados, um pela editora Verus chamado "Pule, Kim Joo So" (2017), inspirado em dramas coreanos, e o mais recente "Meu Pop Virou K-Pop" (2019), escrito em conjunto com a youtuber Thais Midori. Brandalise também mantém um canal no YouTube, em que faz vídeos falando sobre k-pop (Korean Music), dramas coreanos e sobre escrita e criação de narrativas. Gabriela Brandalise é a personalidade do jornalismo que participa nesta semana do Fala, Jornalista!, série de entrevistas publicada quinzenalmente aqui no Portal Mediação.
Por que o jornalismo?
Na verdade, eu escolhi o jornalismo quando eu tinha 17 anos e eu não sabia muito bem o que eu estava fazendo. Eu ia escolher turismo e minha professora de redação falou que eu tinha texto e voz muito boas, e que eu tinha que tentar jornalismo, porque sabia contar histórias e além disso a minha voz poderia servir muito bem no rádio. E eu lembro que escutei o que ela disse e ignorei, mas no dia de preencher a inscrição para o vestibular acabei mudando de turismo para jornalismo no impulso. Então, o jornalismo foi uma coisa aparentemente impulsiva, mas a grande verdade, é que eu sempre escrevi muito. Sempre gostei de contar histórias, então, olhando agora não foi uma coisa tão impulsiva, fez sentido quando eu fiz essa escolha.
Antes e depois do jornalismo: como a profissão te transformou?
A lição que o jornalismo mais me ensinou e que eu levo para a vida foi a de escutar os dois lados. E essa afirmação de ser muito importante ouvir os dois lados da história, não é só para você entender que toda história tem mais de uma versão, mas também para entender que a sua história não é a única. Então, o jornalismo além de me ensinar a ouvir a todas as versões sem pender para nenhum lado - claro que a gente sempre vai perder para algum lado, mas sem necessariamente desconsiderar a outra versão. Então, ainda que você acredite mais ou se identifique mais com uma versão, você não desconsidera as outras. E além disso o jornalismo tira um pouco aquela coisa do alto centrismo. Depois de ser jornalista e passar pela reportagem, você não consegue mais olhar só para o seu umbigo. Porque você escuta a história de tantas pessoas, conhece tantas culturas e visões de mundo, que você começa a perceber que na verdade, muitas vezes a gente cresce acreditando que a vida é uma narrativa em que eu sou o protagonista. E é importante o protagonismo, é importante você entender que você é uma protagonista ou um protagonista que convive com muitos outros protagonistas. Então, essa é uma lição muito preciosa que o jornalismo me ensinou. Foi bom para mim profissionalmente, mas também para o meu caráter.
Qual o conselho você daria a Gabriela estudante de jornalismo?
O conselho que eu daria para a Gabriela estudante de jornalismo, é que todos os jornalistas que ela olha e admira e pensa “Meu Deus, eu nunca vou ser como eles.”, na verdade, são pessoas que tem tantas inseguranças quanto ela. E que tiveram que ralar tanto quanto ela, e o que eu quero dizer é que ela também pode ser uma grande jornalista. Então, o conselho que eu daria para a Gabriela estudante é que continue destemida, continue com muita sede de crescer, melhorar, conhecer e de saber, porque você pode sim ser essa grande jornalista que você tem em mente.
Qual o desafio das faculdades de jornalismo hoje?
O desafio das faculdades de jornalismo hoje, sem dúvida nenhuma, é fazer o estudante entender que o mercado de jornalismo não é mais reportagem, pauta e produção. A profissão mudou muito, os termos mudaram, a maneira de consumir informação mudou e eu sinto que a faculdade de jornalismo ainda está ensinando o estudante a revelar filme. Ainda está ensinando o estudante o lead, e não que essas coisas não sejam importantes, mas eu sinto falta de uma contextualização melhor. As vezes a academia, o meio acadêmico se fecha numa bolha e não percebe que o estudante precisa - não necessariamente sair pronto para o mercado, porque isso não existe. O mercado é muito vivo, muito dinâmico, ninguém nunca estará pronto para ele, porque ele nunca é o mesmo. Então, tudo bem ele não sair pronto para o mercado, mas ele precisa entender o momento do mercado. Como é o mercado agora? É um mercado que precisa de um pauteiro ou é um mercado que precisa de um criador de conteúdo, de um gestor de mídias sociais ou de um cara que sabe muito de storytelling? Então, eu acho que esse é o desafio das faculdades, é não deixar de ensinar o que é o clássico no ensino do jornalismo, mas trazer um pouco desse mundo que está se transformando cada vez mais rápido. E tentar fazer o estudante entender que ele tem que também se transformar com alguma velocidade, porque o mundo não vai esperá-lo.
"Lugar de jornalista é na rua, no mundo,
no ônibus e não fechado na redação"
O melhor da profissão:
O melhor da profissão é conversar com muitas pessoas, de universos muito diferentes e ouvir essas histórias. Histórias que muitas vezes você jamais ouviria se não fosse jornalista. Então, eu acho fascinante ouvir tantas histórias e ao mesmo tempo através das histórias das outras pessoas, eu entender a minha própria história e saber contar a minha própria história da melhor forma. Porque passado é narrativa e quando você constrói uma narrativa de um ponto de vista único, talvez haja distorções. E a partir do momento que você escuta muitas outras histórias, a sua fica um pouco menos pesada ou um pouco menos fantasiosa. E isso produz autoconhecimento, e autoconhecimento produz profissionais melhores. Então, eu acho que o jornalismo não é só uma profissão, é também uma experiência pessoal.
O pior da profissão:
O pior da profissão realmente é a violência contra o jornalista, que a gente vê todos os anos. Jornalistas que morrem, que são calados, censurados, oprimidos e ameaçados porque têm como matéria-prima do seu trabalho a verdade. A gente sabe que a verdade pode ser distorcida, e a verdade tem versões também, mas o jornalista está sempre tentando ser fiel à história e muitas vezes isso vai de frente com interesses. Então, o pior da profissão é o jornalista sofrer represálias por fazer um bom trabalho.
Quem são os teus ídolos no jornalismo?
Eu gosto muito do Heródoto Barbeiro que foi âncora da CBN Nacional do Jornal da Manhã por muitos anos, e hoje está na Record News. O Heródoto continua sendo o meu jornalista favorito, porque por ele ser professor e historiador, ele traz sempre um olhar muito humano para a notícia. Ele traz alguma poesia sem ser pretensioso ou intelectualóide, sempre tentando transmitir a informação com menos de palavras possíveis. Ele escolhe bem as palavras que vai usar e as suas frases são curtas e tem impacto. Ele também traz vários olhares para essa informação. Enfim, o Heródoto é o tipo de comunicador que eu curto muito.
Qual a melhor reportagem?
Melhor reportagem para mim é aquela que traz algo de literário. Eu sou escritora, então, o jornalismo factual é um jornalismo que às vezes não me atrai tanto. Eu gosto do jornalismo que tem alguma poesia, alguma coisa de literatura. Então, para mim a reportagem perfeita é aquela que conta a história não necessariamente seguindo o lead, mas a reportagem que está preocupada em trazer uma narrativa interessante, desenhar bem esses personagens, ter um ponto de virada, um texto oxigenado e que segura o leitor.
"Depois de ser jornalista e passar
pela reportagem, você não consegue
mais olhar só para o seu umbigo"
O que não pode faltar na mochila de um jornalista?
O que não pode faltar na mochila de um jornalista hoje é o smartphone. Ele tem que estar com o smartphone na mão para fotografar, filmar, registrar, gravar um insight, anotar um contato, fazer uma pesquisa rápida. O smartphone hoje, eu acho que vale as vezes por uma redação de jornal inteiro.
O melhor amigo do jornalista é…
São os ouvidos dele, porque o jornalista tem que ouvir. Jornalista que fala demais, eu sempre desconfio.
O jornalismo vai acabar?
O jornalismo nunca vai acabar, porque o jornalismo em essência é a contação de histórias. E desde a época das cavernas, o homem conta história e isso nunca vai mudar.
Por que o jornalismo importa?
Porque o jornalista ele faz a ponte entre a população e a informação, no sentido de às vezes traduzir aquilo que está acontecendo. Claro que todo mundo hoje tem acesso à informação, mas muitas pessoas não sabem interpretar os fatos. Então, o jornalista traz essa interpretação, ele conta para as pessoas sobre, ele traz todos os pontos de vista e traz contexto histórico que muitas vezes falta na internet. O cara pega uma informação isolada, não considera contexto, não considera passado e regurgita aquilo nas redes sociais sem qualquer tipo de interpretação, de reflexão sobre o fato. Então, o jornalista é muito importante porque ele contribui com uma informação de qualidade.
Lugar de jornalista é…
Lugar de jornalista é na rua, no mundo, no ônibus e não fechado na redação. Mas também não é com a cara colada no celular, o jornalista tem que estar na rua, no mundo olhando, prestando atenção a sua volta, escutando conversa dos outros, perguntando, pesquisando, também no computador, mas não só no computador. Lugar de jornalista é no mundo.
Se não fosse jornalista seria…
Se eu não fosse jornalista eu ia ser alguma outra profissão como palestrante ou consultora, porque eu gosto muito de lidar com pessoas, de trocar, aprender, ensinar... Então, eu seria palestrante ou consultora.
"O estudante tem que também se
transformar com alguma velocidade,
porque o mundo não vai esperá-lo"
Um recado para os futuros jornalistas:
Não esperem ser empregado por alguém, crie o seu trabalho e a sua profissão. Se você sente que há uma demanda, crie essa profissão. Não se preocupe em procurar emprego mas em criar empregos, se especialize em assuntos, aprenda a fazer coisas para preencher as demandas que existem no mercado. Tem muito espaço para jornalista trabalhar e o que o jornalista não entendeu é que não é necessariamente espaço para pauteiro e reportagem. Não é necessariamente pessoas para fazer blog, tem muita gente precisando de jornalista porque tem muita gente precisando de especialista em contação de história, e o jornalista precisa encontrar esse lugar. O jornalista pode por exemplo trabalhar na criação de um aplicativo de jogo e por que? Porque o jornalista sabe contar história, ele não sabe nada de programação mas sabe criar um personagem, sabe criar uma história que tem começo, meio e fim, sabe criar uma história que tem plot twist. Então, o jornalista ele tem que estar atento a isso. Não a procurar emprego, mas a criar o seu próprio emprego.
Foto: Amanda Zanluca